quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Quando amantes não se entendem

.



Esta Segunda-feira passada, o programa Roda Viva reprisou a entrevista da série de especiais da Flip 2007 com a escritora sul-africana Nadine Gordimer, Nobel de Literatura de 1991. Uma senhora de idade já avançada cuja forma enxuta, lucidez, olhar sereno e confiante e, principalmente, extrema simplicidade, em contraste com sua literatura de temática forte e fundo político chegava a ser um tanto desconcertante para o time de primeira linha de jornalistas e críticos literários escolhidos para cercá-la de questões.

Jornalismo e literatura: algumas vezes tão próximos que chegam a tocar-se como amantes ternos ou promíscuos, e outras tão distantes que mal conseguem se entender. Foi doloroso sentir essa distância ali. Eles (os jornalistas) pareciam desnorteados com a atitude tranqüila e singela da escritora. Era quase como se pudéssemos ouvi-los pensando freneticamente “Ora, estamos diante de um Prêmio Nobel aqui. Tem de haver alguma coisa, algum segredo, alguma verdade universal que ela não vai nos dizer a não ser que mostremos o quão somos brilhantes e profissionais, tirando da manga a pergunta certa!”, enquanto escolhiam cuidadosamente as palavras.

Acontece que por vezes, ser brilhante e profissional em jornalismo pode ser o “chover no molhado”. E ‘a pergunta certa’, aquela capaz de trazer à tona a emoção necessária para fazer transbordar junto a verdade procurada, é tão batida que a gente chega a se sentir envergonhado de ouvir. Eu sei como é (ao menos estou tentando entender): estudo isso. Mesmo assim, não escapei de me sentir envergonhada. Tanto por meus futuros colegas, jornalistas, quanto pela colega escritora (é, tem uma certa estrada de diferença – ô, e como! –, mas já estou me apossando do status, seguindo ordens registradas de Rilke em seu testamento aos jovens escritores, as “CARTAS A UM JOVEM POETA”. Aliás, um dos meus livros de cabeceira, para o caso de eu me achar modesta demais para chamá-lo colega também – o que, não raro, acontece. Inevitavelmente.).

Assim passou-se uma hora entre perguntas como “Qual seu método de trabalho?”, “Qual a importância do Prêmio Nobel?”, “Que livro você trouxe na mala?” ou “Que livro você vai levar na mala?” e outras tantas bem profissionais. E a verdade, essencial, intrigante, preciosa e universal, fosse ela qual fosse, permaneceu não verbalizada, embora talvez estivesse mesmo bem ali o tempo inteiro. E, como em toda conversa de amantes que não conseguem se entender, permaneceu intocada. Em toda sua simplicidade.


“O que se relata nos livros de história é apenas parte dos fatos, mas a literatura tem a capacidade de identificar o que aconteceu dentro das pessoas durante esses momentos de conflitos".
Nadine Gordimer

domingo, 27 de janeiro de 2008

Paixão Pitoresca

.






Além do Bukowski, estou lendo “Debret e o Brasil – Obras Completas – 1816-1831” (cujo catálogo raisonné é tuuuuuudo), que meu pai me deu de presente. Ele trabalhou no projeto, tratando e restaurando as imagens para impressão do livro e seu nome aparece nos créditos. Foi o melhor presente que ganhei esse ano (não se preocupem. Ainda dá tempo de tentar superar, pessoal!).

É delicioso aprender história desse jeito, através da arte. Aquela correria para apresentar os fatos resumidamente que acontece na escola é sempre uma decepção.

Apaixonante, a obra de Debret. Ele retratou um período extremamente significativo da história, em que nosso país era, nas palavras do próprio, “Pittoresque”. E o livro é simplesmente lindo.

Bem, e o Debret também. Até mais que bastante para sua época (isso me lembra o Renoir do filme do Modigliani. A bem da verdade, muito na história da pintura nos faz ser gratos pelos avanços da ciência estética...). Aliás, ponto a favor do francês é que ele, já ciente de seu papel histórico na época, não idealiza nada e ninguém.
O pintor oficial do Império não era como nenhum dos grandes problemáticos da Literatura por quem geralmente me apaixono. Sua maior aventura, essa viagem pitoresca, nos rendeu as imagens conscientes e inconscientes que temos coletivamente do Brasil Imperial. E ele viveu muitos anos além do que era a expectativa de vida média da época – chegou aos 80 anos. Raridade, mas acontece: um artista bem comportado, bem aceito, e reconhecido em seu tempo. Merecidamente. Ele é realmente único.




-------------------------------------------------------------









P.S.: Mas de quatro quem me deixa mesmo é essa galera aí:

Arthur RIMBAU, Herman HESSE, Franz KAFKA,
Douglas ADAMS & Henry David THOREAU.

Nada bonitos. – Pouco regrados. – Nenhum brasileiro. – Vivos só em páginas finitas. – Et superbes



P.S. 2: Será que tem cura?

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Verbete: Fanfiction

.

Você sabe o que é fanfiction?

Bem, como provavelmente quem está lendo esta postagem é:
– um dos meus amigos;
– contatos do MSN;
– ou já conseguiu sobreviver ao meu “mais de 15 minutos falando sobre Realismo Fantástico” (e ganhou algo da minha confiança e todo meu respeito)
provavelmente já trocamos uma ou duas palavras sobre o tema.

Mas se você é:
– um curioso oriundo do orkut;
– está viajando sem rumo na eterna noite do espaço virtual;
– é algum grande editor que trabalha excessivamente, a quem indicaram este blog (não custa nada sonhar... Oi, Grande Editor! Fique à vontade.);
– ou está no planeta para expandir o verbete ‘Terra’ no mais incrível e indispensável livro do universo conhecido (eu juro que vou me curar. Já até comecei a terapia: lendo Bukowski a partir de HOJE),
então talvez você não saiba do que se trata. Embora possivelmente o editor já tenha conhecimento do fenômeno.

Bem, que eu saiba, não existe uma definição léxica oficial deste verbete. Então vamos por partes.

Você com certeza já leu um livro cujos personagens pareciam reais a ponto a ponto de quase poder falar com eles e imaginou, durante o dia inteiro de trabalho ou estudo o que de melhor (ou pior) poderia acontecer a eles. Provavelmente já assistiu a um filme com cujo final não concordou e pensou que você mesmo teria feito melhor ou diferente. E os seriados? Meses de intervalo entre as temporadas deixam qualquer um idealizando.

Pois é. Acontece que algumas pessoas têm uma comichão idealista incontrolável. E quando isso acontece com quem tem algum talento para escrever e um certo domínio de gramática, não tem jeito: quando menos se espera se está escrevendo fanfictions – e lendo compulsivamente!

A ficção escrita por fãs já tem sido alvo de estudos. Soube de algumas teses a respeito do assunto e monografias premiadas. É um fenômeno que explodiu nos últimos anos. Mas não é recente. É notória a contratação dos “fanfiqueiros” de Star Treck que se tornaram roteiristas da série e outros que acabaram escrevendo livros oficiais para a franquia.

Voltando um pouco mais no tempo, não é difícil observar na ‘Grande Literatura’ casos de escritores que usaram de seus livros preferidos como fonte de inspiração para seus próprios livros. E outros que tiveram por base livros de sua predileção, até reescrevendo-os. Muitos suplantaram totalmente a obra original.

O mais impressionante e hipnótico nessas histórias é o caráter essencialmente passional desse tipo de ficção. Não se escreve fanfiction por escrever. Geralmente estamos emocionalmente ligados com a situação “vivida” por aquela personagem preferida. Ou gostaríamos de ver como aquele herói se sairia num ambiente ou/e situação diversos daquele em que foi originalmente descrito. Às vezes dá pra ir até além do escrever só pela paixão. Mais um exemplo de como as fronteiras entre o marginal e o reconhecido não estão exatamente delimitadas é o Jô Soares, que ganhou bastante dinheiro e fama às custas do que Arthur Conan Doyle criou de mais popular. E o Sherlock Holmes ganhou um belo “revertério” com a comida dos trópicos...

Mas as motivações para escrever não param por aí.

Nos últimos meses, entrei em contato com diversos fanfiqueiros, a maioria dos Estados Unidos e Canadá, alguns do Reino Unido e Alemanha, além dos brasileiros também, claro. Passei feedback das histórias que li, perguntei a respeito de suas influências literárias e aspirações com a escrita. Não formulei estatísticas, mas muitos declaram não ter ambições além de se divertir e aos amigos, ou matar a ansiedade entre o intervalo de lançamento de um livro e outro da série, ou temporada de seriado. E escrevem porque gostam, ou como escape de uma vida em sociedade que não dá muito espaço aos nossos sonhos – todos concordamos que a vida real é mesmo muito dura (algumas vezes chata e outras meio sem graça), afinal de contas.

Mas outros têm sim aspirações literárias, pretendem ser escritores e emprestam seus talentos às fanfictions (dedinho levantado aqui, eu! Eu! Eu!). Mas o que se recebe em troca não é pouco: você aperfeiçoa suas habilidades, e trabalha seus pontos fracos. E o melhor: tem leitores. Eles costumam responder, e geralmente estão dispostos a discutir seu trabalho. E vamos admitir, isso é delicioso. E muito menos frio que encadernar aquele livro ao qual você se dedicou tanto, enviar pra umas cinco editoras e não receber resposta nenhuma além de, algumas vezes, um pálido ou gélido “obrigado por enviar seu trabalho. Você está na fila de espera para entrar em um de nossos catálogos de novos escritores.” Isso quando muito. E tudo o que você queria era que alguém te enviasse um parecer sobre o que você escreveu. Mesmo que fosse um “Desista enquanto pode.” Claro que eu não ia desistir. Ia achar que é conspiração contra a Walt Whitman do século XXI aqui.

Não estou dizendo que esse processo de ir em busca das editoras não é importante. Gosto de passar pelo que tantos escritores já passaram. Mas, vamos lá, qualquer escritor do(s) século(s) passado(s) ia gostar de ser parte de um fórum com gente bacana e que apreciasse e se envolvesse de verdade o que eles escrevem. Sempre achei aqueles clubes de Sarau e literatos à la “Fim de semana na Maison de Lord Byron” meio forçados. Se você não nascesse na nata ou não fosse chegado em “papoula processada” então, piorou... Aliás, acho que muitos deles não teriam desistido da carreira literária (ai, Rimbaud... O que fizeram com você, mon amour?).

Por essas e outras é que eu faria minha monografia a respeito desse tema se estivesse cursando letras.

Ah, e que amo ter nascido nesta época.

E também escrever fanfiction.





Já pensou seqüestrar o Spock e cortar a pontinha de uma de suas orelhas pra enviar ao Kirk como prova de que ele está vivo? Sem nem precisar sentir muita culpa, já que a ciência da época dele regenera praticamente tudo. Pena que provavelmente não é um argumento em que valha a pena investir: algum trekker tétrico já deve ter pensado nisso. Já viu quantas histórias deles ocupam as páginas do fanfiction.net?



P.S.: "Fanfiqueiro" não é um neologismo pelo qual eu tenha exatamente afeição, simplesmente devido à sonoridade da palavra. Mas fazer o quê?

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Centralizando

.


Não é muito difícil cumprir a meta virgílica quando se está de férias e lendo as Iluminuras (faltando inspiração, é só ler Rimbaud que a coisa vai!). O grande problema é que a maioria do que sai da diluição da inspiração pura das imagens frenéticas da mascote de uma das versões do clube do haxixe não é lá muito publicável... Aliás, o próprio Rimbaud não conseguiu vender livro na época em que editou – ainda ficou devendo pra família. Foi só anos depois que alguém encontrou, num porão, dezenas de exemplares dos livros dele. Pois é. O loirinho acabou virando traficante de armas na Argélia e hoje não há almofadinha, pseudo-crítico, pretenso cult ou aspirante a escritor, poeta ou literato que não fique babando ‘Rimbaud pra cá, Rimbaud pra lá’ (mais ou menos como eu agora heheh).

Então, embora meu caderninho verde e até a agenda do ano estejam ficando sem espaço, ainda não tinha postado um texto por aqui... Apesar de que, se me perguntar o que ando fazendo, é até capaz do discurso parecer com o daquelas ‘modelo-manequim-atriz-estudante-de-jornalismo’ (elas sempre acabam indo estudar jornalismo, e eu sempre tenho que emprestar o caderno e dar cola. Nada contra vocês, queridas coleguinhas, mas, como bem sugerido por uma boa amiga, vou passar a vender a cola) que sempre aparecem nos “Jorge Horácio By Night da vida”. Pergunta pra ver: estou escrevendo ficção moderna direcionada a um público específico, traduzindo textos populares contemporâneos, lendo novos autores franceses (a respeito dos três itens anteriores, ver também o próximo post – verbete: fanfiction), me dedicando diariamente à poesia e eventualmente àquele bem conhecido projeto, meu livro – tem gente que pensa que é lenda, mas não é. Juro que um dia acabo...

Pois é, mas nada disso preenche a lacuna que todo escritor ou aspirante de nossa época deve preencher: o Blog!

Não gosto do ‘deve’. Muito possivelmente é o ‘deve’ que me atrasa.

Mas, o que escrever no Blog?

Tentei começar por uma coisa simples: aquilo que, no momento, me preocupa. Provavelmente nunca faltaria assunto, do jeito que esquento a cabeça:
– os conflitos de rua no Quênia;
– a situação calamitosa estagnada do Haiti;
– o paradeiro atual do Hubble (onde será que ele está, desamparado e perdido no espaço. Eu costumava ser tão apegada a ele...);
– a greve de roteiristas americanos que não acaba (é triste ser culturalmente colonizado...);
– o papel higiênico que acabou e eu vou ter de ir buscar na chuva;
– como manipular meu irmão pra que ele vá buscar o papel higiênico na chuva, em vez de mim;
– o personagem preferido que está lá, triste e sozinho enquanto não retomo as páginas;
– a eterna e intrigante questão: ‘será que minha poesia é tão ruim quando a dos Vogons?’ (Desculpa, não resisti. Culpa do Douglas Adams: “O Guia do Mochileiro das Galáxias” é o livro da minha vida esse mês). Um dia publico aqui, minha poesia;
– tem também a pergunta que provavelmente impulsionou humanidade em sua evolução até este ponto: o que vou almoçar hoje?

Tudo isso dá postagem. Mas nada nesse exato momento me preocupa mais que uma questão que é, na medida do possível de ordem prática e que, teoricamente está em minhas mãos solucionar: Como é que acerto esse raio de banner que não fica como quero? Sério! Toda vez que venho para o computador e começo a escrever, eu abro essa página e não agüento olhar a falta de simetria entre o banner e o título da página. Não é que eu tenha nenhuma neurose com o número de ouro não. Mas toda vez eu começo a mexer nas configurações e pronto: nunca que escrevo nada e nunca que acerto o banner. Já decidi fazer manualmente e aí me surge outra problemática existencial: a fonte. Que fonte escolher para não parecer pedante, arrogante, maçante ou esteticamente ignorante?

Isso até parece fútil, ou post de quem anda tentando demasiadamente criar empatia com coleguinhas ‘modelo-manequim-atriz-estudante-de-jornalismo’ (com o agora legítimo fim de estabilizar a situação econômica deste país emergente que sou eu). Mas não é. O banner é muito importante. Ele tem a inegavelmente crucial função de pelo menos embelezar ou distrair quem chegou até esta página, mas achou o texto um saco, ou grande demais (não se preocupe. Eu não fico chateada. Tem gente que acha a mesma coisa de Dostoiévski). Se o banner for bonitinho, sempre dá pra pensar: “Pelo menos tem um banner maneiro.”





P.S.: Se você tem alguma informação sobre a atual situação do Quênia, o paradeiro aproximado do Hubble ou uma dica de fonte que combine com o banner desta página, por favor entre em contato pelo emailparatalita@gmail.com

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Meta Virgílica

Nem um dia sem ao menos uma linha.


Virgílio nas minhas palavras, tá certo, mas o estímulo continua o mesmo. E eu vou perseguir a meta.


Este perfil que vos fala
Acredita na meta virgílica
– embora não tenha a disciplina
necessária para segui-la o ano inteiro
nem internet banda larga a disposição integral
mas vou tentar postar em períodos regulares.

Também acredito na 2ª pessoa do plural e do singular,
Na vida própria que a língua assume no espaço virtual,
Na beleza das abreviações inteligentes,
Na experimentação e uso de novos caracteres,E que tem alguém lendo isso – às vezes é bom não ser tão cética... Parafraseando o famoso pôster de loja da 5ª avenida,
EU QUERO ACREDITAR!