sábado, 7 de fevereiro de 2009

Advertência

A pena parada causa sensação de anestesia do tempo e deslocamento da existência.

Registros anteriores mostram que é necessário reabilitar o organismo letra a letra para que:

o sangue possa aquecer;

ar venha a entrar;

e o tempo volte a pulsar.

O tratamento exige disciplina – algo nem sempre encontrado nos diversos impacientes – mas contenta-se com a abnegada e turbulenta paixão impreterivelmente detectada em todos os casos conhecidos.

Para maiores informações, aconselha-se buscar um bom especialista, como Rilke ou outro de sua predileção; ou como o primeiro sugere, submeter-se ao auto-exame sem temer a resposta.

Esta indesejável condição tem cura, que depende apenas da parte mais dolorosa do tratamento: seu início. Mas este certamente surte efeito: para alguns, inclusive, de imediato alívio e bem estar. É notório, apesar disso, que houve casos em que a angústia inerente ao processo acompanhou o portador até seus últimos registros.

De todo modo, é preciso querer o possível ou o impossível para encontrar no caos o caminho para o mundo. E, definitivamente, não temer sua própria resposta.




P.S.: Dedico a alguém que me é cara e que esteve dodói de verdade esta semana. Que bom que da moléstia acima descrita não sofre.

domingo, 25 de janeiro de 2009

De volta via 85P

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Já há tempo não passo por este planeta. Mas às vezes é preciso viajar. Nunca abandonei meu amor pela pequena rosa que aqui habita, a rosa de meu maior desejo, que eu espero saber não deixar morrer.

Sei que gosto de perguntar sem me fazer responder em troca quando questionada. Não gosto de (me) explicar, mas conheço que as pessoas tem necessidade de entender. Se apenas sentissem o que sinto agora e me põe a escrever... (alguns não gostam de dizer sentir e apenas chamam a isso vida.)

Neste último ano, tive de arrancar muitos baobás (como muitos tiveram) e não pude sequer ver um pôr-do-sol (além daqueles do verão de minha última tristeza dita frívola) apesar de ter havido dias em que poderia ter visto o sol se pôr quarenta e três vezes.

Não me comparo a qualquer belo ser de real inteligência ou enigmática realeza. Mas descobri que, apesar de ter desejado deixar de ser criança, ainda não consegui ser como as pessoas grandes. Posso usar e apreciar a beleza dos números. Posso ter em mente toda a linearidade estrutural dos grandes textos (qualquer que seja seu tamanho). Mas a verdade é que tenho tendência a ousar tão somente me deixar levar pela trajetória errática de um cometa simpático que passe diante de mim. E mesmo sem saber se um dia volto incólume para meu pequeno e único amor, tão grande e delicado que exige muitas vezes cuidados lineares e estruturais – os quais provavelmente nunca lhe dei como devido – o que posso dizer é que amo. Amo escrever. E mesmo quando longe, não estou menos que perto.

Talvez eu não ame direitinho (um pouquinho e todos os dias) como amou Virgílio, mas eu certamente amo mais que a própria sensação fixa e exigente (um pouquinho e todos os dias) a que chamam, com simplicidade, vida.



P.S.: 85P = cometa que passou por aqui em Janeiro deste ano.